No último sábado (7), o Programa Campo Web, que sempre traz informações atualizadas sobre o mundo agro, aliadas a reflexões inteligentes a respeito da agricultura, entrevistou o agricultor Laércio Dalla Vecchia. Mais conhecido pela sua alcunha ‘Laércio, o Agricultor’, o produtor de soja do sudoeste paranaense é famoso nas redes sociais por seus vídeos onde dá dicas de manejo das lavouras: “Me sinto muito feliz de compartilhar informação e conhecimento. Acho que o conhecimento só é válido quando compartilhamos”, disse.
Campeão nacional de produtividade do soja em 2019/2020, com 118,8 sacas por hectare, Laércio foi convidado a falar sobre o papel do perfil de solo dentro de situações de dificuldades climatológicas como a escassez de chuvas:
- “Na nossa região, o solo tinha muito alumínio tóxico. A primeira vez que meu pai plantou milho, a planta não se desenvolveu. Mas hoje temos um perfil de solo de 60cm. Em anos nos quais há escassez hídrica, é muito nítida a diferença entre as áreas onde temos um perfil de solo e as que não possuem. Depois de termos o solo corrigido, o manejo da lavoura não muda, mas as plantas vêm totalmente diferente. A raiz do trigo, do soja e do milho crescem por dutos abertos por outras plantas que as antecedem. Por exemplo, temos um sistema de plantio direto muito intensivo, com várias plantas de cobertura. Então, existem muitos dutos abertos que permitem que a raiz se aprofunde”.
Instigado por José Domingos, o agricultor do Paraná deu mais detalhes das características do solo da sua região:
- “Como temos muito alumínio, o calcário faz toda a diferença no nosso solo: disponibilizou fósforo e potássio. Temos áreas com 8% de matéria orgânica e CTC acima de vinte. Sendo que o fósforo subiu sem aplicação do mineral. Nossa microrregião tinha muito fósforo preso”.
O agricultor então falou de preparação da terra para o plantio:
- ”Quando colhemos o soja do ano passado, já planejamos o que iríamos plantar agora no final de setembro e começo de outubro. Esperamos o soja guacho nascer, passamos um produto de contato para matar esse soja, e plantamos as plantas de cobertura como se fossem a safra principal. Dedicamos muito carinho e atenção para essas plantas. Por exemplo, antes do milho verão, preconizamos nabo. E também ervilha ou ervilhaca, que fixam nitrogênio para o cultivo do milho. As raízes dessas plantas, quando chove bastante, são dutos que ajudam a levar a água para baixo, e evitar erosão”.
Em seguida, Laércio utilizou de analogia para justificar a importância das plantas de cobertura e do manejo da terra:
- “Se analisarmos nosso solo, é como se fosse um cabo de fibra ótica: as plantas se conversam, elas se ajudam. Quando fazemos nosso mix de cobertura, é mais ou menos como viver em sociedade: cada planta faz uma função. Como produtor, eu pensava que, para colher mais, era preciso gastar mais. Hoje vejo que não é assim: precisamos é pensar no sistema, pensar na vida no solo, pensar em condições mais adequadas para plantação. Cuidando do solo, o solo devolve o que aplicamos nele”, explicou.
Falando dos mix, Laércio explicou como organiza as plantações em sua propriedade, listando as culturas com as quais trabalha:
- “Na grande maioria, compro os mix prontos, mas alguma coisa eu produzo na propriedade. Ano passado, colhi trigo misturado com ervilha, e produzi também ervilhaca. Também colhemos trigo morisco e painço. Além de triticale, aveia, cevada, centeio, milho, soja e feijão de várias especialidades. Já tentei plantar arroz e girassol, mas acabou não dando certo”, disse.
Apesar de ser um produtor dedicado e apaixonado pela sua profissão, Laércio também precisa lidar com pragas na lavoura. O agricultor comentou sobre esse assunto:
- “Em nossa região estamos entre 900 e 1000 metros de altitude. Então, o mofo branco é um problema sério, que manejamos com bastante palha. Com uma camada de palha de 2cm de espessura, os esporos do mofo não conseguem ser exalados. As plantas de cobertura também produzem naturalmente autodefesas que ajudam no combate ao mofo. A lagarta rosca também é um problema cultura do milho, que tratamos com inseticida fisiológico. Tudo é manejo e monitoramento”.
Laércio também se destacou por misturar mais de uma cultivar de soja em sua lavoura. O agricultor do Paraná detalhou esse processo para os espectadores do Campo Web:
- “Quem começou a prática foi um amigo do oeste do Paraná. Ao fazer um ensaio para uma determinada cooperativa, ficou com 2kg de cada cultivar de soja sobrando. Então, misturou 27 variedades de soja, desde hiper precoces até ciclos mais longos, e aquele foi o ano em que ele mais colheu soja naquele campo. Cada variedade de soja tem uma particularidade diferente, e acabam se agregando muito. A partir dessas observações, começamos a misturar variedades com ciclo parecido. As plantas mais jovens possuem um hormônio que ajuda na defesa. E acabam passando essa defesa para as plantas que ainda não floresceram. Quando as plantas começam a maturar, as que estão um pouco mais atrasadas vêm junto”, disse, contando que adaptou essa estratégia também para o plantio do milho. Em seguida, Laércio revelou as proporções do seu mix de soja: 50% é da variedade Zeus, e os outros 50% são divididos entre as variedades 5354, 1511, BRS 1054.
A busca por uma produção mais sustentável e com mais produtividade também é um objetivo de Laércio, que destacou, mais uma vez, o diálogo e a troca de informações como essenciais para um melhor desempenho agrícola:
- “Uma das melhores coisas que podemos fazer é compartilhar experiências. Porque o que eu coloco na prática é de alguém que testou e compartilhou comigo. Recebo muitas visitas, e através da conversa há uma soma, uma troca de experiências. Seis anos atrás, colhi 97 sacos por hectare. No ano seguinte, pensei, na minha ingenuidade, que era só aumentar a adubação e as aplicações químicas e tudo daria certo. Porém, quando fui colher a área, colhi 81 sacos, e com um investimento muito grande. O excesso é tão prejudicial quanto à falta. A partir daquele ano, foquei em sistema plantio direto de qualidade, plantas de cobertura e monitoramento. Com menos gastos e colocando exatamente o que as plantas precisam, a colheita é maior”, disse, destacando que, a partir desse método, pela primeira na história do CESB, a área campeã teve zero aplicação de inseticida.
Laércio também destacou seu custo de produção:
- “Meu custo por hectare não é alto. Quando vou preparar a área, não tenho ervas de difícil controle. Então, eu consigo economizar em herbicida. Quanto a fungicidas, com a rotação de cultura, tenho menos pressão de doença. Outra coisa: as plantas de cobertura reciclam muitos nutrientes. Estou conseguindo colher bem gastando pouco", finalizou.