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Tupanciretã

Militares para quem precisa deles

Nesta publicação, o escritor tupanciretanense Antônio Schimeneck, leitor do JM Digital, aborda a temática da escola cívico-militar e uma análise histórica sobre a antiga Escola Tupanciretã, que passou por diversas transformações, e ainda passa

Publicada em 27/04/21 às 16:16h

Antônio Schimeneck - Escritor


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Antônio Schimeneck – Escritor

26/04/2021

 

Fui aluno na Escola Estadual Tupanciretã. A gente chamava de Colégio Tupã. Na época, o prédio era bem diferente. Oriundo de uma campanha de alfabetização da década de 60: as Brizoletas. Eram prédios pequenos, de madeira, sem área coberta para esportes e recreação. Na minha memória ficaram o pátio dividido, o das meninas e o dos meninos; a Dona Rosa e seu carreteiro inigualável; minha primeira professora, a Arlete Gress.

Isso foi no começo dos anos 80. Por essa época, teve também uma música que me marcou: Coração de estudante, cantada por Milton Nascimento. A canção mexeu com algo que, naquele momento, não conseguia explicar, mas entrei no clima de desolação ao escutá-la dando o tom ao sepultamento de um presidente que era promessa de novos tempos: Tancredo Neves.

Eu não fazia ideia desses tempos. Os significados vieram mais tarde.

Bom, numa noite de silêncios interrompidos por eventuais apitos de trem, o Tupã pegou fogo. Eu já estava no Poli, de modo que não fui prejudicado diretamente. Minha irmã, a Rita, foi. Precisou estudar mais longe de casa. Após longo processo de construção, como de praxe as obras públicas costumam ser, um novo prédio, mais moderno, maior, ficou pronto.

É o que está até hoje em atividade.

É também um que acaba de mudar de nome e de sentido.

Li a notícia nas redes do Jornal Manchete. Estou longe da cidade há tempos, mas familiares e amigos moram no município. Bastante afeto me liga a esta cidade. Então, saber que meu antigo estabelecimento de ensino se transformou numa Escola Cívico-militar, me chamou à reflexão.

 


As três últimas notícias reportadas pelo Manchete no Facebook tiveram, até o momento em que escrevo, 489 reações positivas, 39 comentários favoráveis e 24 compartilhamentos. Tomei um susto. Me perguntei se nenhum dos leitores acha, como eu, a ideia nefasta. Num primeiro momento pensei em deixar pra lá, afinal, não vai mudar absolutamente nada, é jogo jogado, fato acabado, fim da história. Mas a vontade de dizer alguma coisa permaneceu.



Culpa da literatura. Eu sei que é. Quem um dia se viu picado pelos livros, não consegue ler uma notícia dessas e seguir em frente como se nada tivesse acontecido. Tem uma comichão que começa na mente e termina na ponta dos dedos.

Ninguém perguntou e talvez nem queira ou vá ler. Mesmo assim, vou dar minha opinião: acho lamentável esse militarismo na educação. Acho vergonhoso que a administração pública use como muleta o aparelhamento bolsonarista em vez de preocupar-se com uma educação de qualidade, que permita o livre pensamento, a crítica. Pior ainda, que invista numa ideologia que ignora chagas abertas como a desigualdade social (que aliás campeia pelo Rio Grande), como a homofobia, o racismo e a misoginia.

Da última vez, eles tomaram o poder na ânsia de salvar o país de um mal inexistente e improvável: o comunismo. Ficaram por 21 anos, deixando o país atolado numa crise econômica sem precedentes, com um saldo de mortos e desaparecidos políticos (na sua maioria estudantes cheios de utopia e de inconformidade com o estado ditatorial) e que fez da tortura ferida fétida e incurável.

Sem o devido expurgo da justiça, eles estão de volta. Ávidos de poder.

A história está aí. Quem tiver boa memória, bom senso ou curiosidade, que a conte.

Ah, ninguém perguntou também, mas se eu pudesse sugerir um nome para a nova escola, seria Dona Rosa.

Mas Dona Rosa era negra e pobre.

Ela não combina com a cerimônia de uma Instituição Cívico-militar, para estas, os mitos são mais apropriados.

Para uma escola se chamar Dona Rosa, ela precisaria primar pela liberdade, pelo poder de fala, pelo vestir do jeito que der na veneta, pelo cabelo desorganizado e impensado. A arte seria o único critério possível de admissão. Livros estariam espalhados à mão cheia. A diferença seria exaltada. Nos intervalos, um dia se ouviria música clássica, noutro funk. Meninos e meninas dançariam balé e jogariam capoeira, e ninguém seria execrado por amar um igual.

Para se chamar Dona Rosa, uma escola não estaria disposta a lamber botas de um coronel, menos ainda de um capitão de terceira classe.



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